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Novos relatos mostram que segurança e órgãos federais sabiam de movimento de bolsonaristas dias antes dos atos terroristas

Novos relatos mostram que segurança e órgãos federais sabiam de movimento de bolsonaristas dias antes dos atos terroristas

Brasília, 04 de fevereiro de 2023

Por José Vianna e Iana Caramori, TV Globo e g1 DF

Adaptações

Alexandre Torres

Guará News

ex-subsecretária de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do DF Marília Ferreira Alencar disse à Polícia Federal que as Polícias Militar e Civil, o Corpo de Bombeiros, o STF, o Senado e outros órgãos ligados à segurança sabiam sobre a movimentação de bolsonaristas radicais em Brasília antes dos ataques às sedes dos três poderes, em 8 de janeiro passado.

Segundo ela, forças de segurança de diversos órgãos participavam de um grupo de Whatsapp onde eram repassadas, desde o dia 6 de janeiro, informações sobre as movimentações dos grupos contrários ao resultado do segundo turno das eleições para a presidência da República.

“Na noite de sexta-feira (6), por volta de 22h, chegou uma informação no grupo de WhatsApp denominado ‘perímetros segurança’ que havia chegado em Brasília cerca de 43 ônibus fretados com o total de 1.622 passageiros para a manifestação que ocorreria no dia 08 de janeiro”, disse Marília no depoimento à PF.

 

Entre os membros do grupo estavam também representantes do Detran, do DER, e Ministério de Relações Exteriores (MRE), conforme o depoimento. O g1 entrou em contato com a assessoria dos órgãos citados, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

As declarações as quais o g1 teve acesso foram dadas durante depoimento à Polícia Federal no dia 27 de janeiro. Na ocasião, Marília – que também é delegada da PF – teve o celular apreendido para ser periciado.

Segundo a ex-subsecretária, as manifestações eram de conhecimento da pasta desde o dia 5 de janeiro. No dia seguinte, 6 de janeiro, Marília afirma que um relatório de inteligência reuniu informações sobre “possíveis invasões de ocupação de prédio público, bloqueio de refinaria e distribuidoras de combustíveis e possivelmente uma greve geral no dia 9 de janeiro”.

Véspera dos ataques

 

Bolsonarista radical durante ataques terroristas aos prédios dos poderes em Brasília — Foto: Eraldo Peres/AP

Bolsonarista radical durante ataques terroristas aos prédios dos poderes em Brasília — Foto: Eraldo Peres/AP

Ainda de acordo com o depoimento, durante todo o dia 7 de janeiro, a movimentação dos bolsonaristas acampados em frente ao Quartel-General, em Brasília, foi monitorada pela pasta e as informações, repassadas para os órgãos por meio do grupo no WhatsApp.

“Foram informados nesse período a chegada de ônibus vindos de várias localidades, com registro das placas, quantidade de pessoas locais em que os ônibus estavam estacionados”, declarou Marília, no depoimento. No mesmo dia, os bolsonaristas teriam feito manifestações mais exaltadas no acampamento, segundo o depoimento.

“Foi ressaltado nas frações de inteligência ânimos exaltados de alguns acampados no Quartel-General do Exército, inclusive com manifestação de intenções de confronto com as forças de segurança”, apontou Marília.

 

Também foram registradas falas de incitação de ocupação de prédios públicos, mas “sem uma coordenação efetiva”. No entanto, na noite daquele sábado (7) “os informes recebidos e compartilhados indicavam um clima tranquilo no acampamento e ainda não havia definição sobre a descida dos manifestantes para a Esplanada dos Ministérios“.

Aviso ao Supremo

À Polícia Federal, a ex-subsecretária disse ainda que na manhã do dia 7 de janeiro, “entrou em contato com o núcleo de inteligência do STF para iniciar o canal de troca de informações, comunicar que a SI [Secretaria de Inteligência] estava acompanhando toda a movimentação e se colocar à disposição daquela agência”.

Marília afirma que a secretaria fez o mesmo comunicado à Polícia Federal e a Agência Brasileira de Inteligência (Abin). No depoimento, a ex-subsecretária não diz se houve retorno dos órgãos citados.

Um dia antes, o STF teria gerado um informe de inteligência que corroborava o quantitativo de ônibus fretados à capital, mas que não considerava “pudesse refletir em uma adesão massiva ao movimento”, de acordo com as informações apresentadas no depoimento.

g1 entrou em contato com o STF para confirmar as informações, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.

Ataques terroristas

No dia 8 de janeiro, Marília afirma que “foi compartilhado por várias agências que os manifestantes intencionavam se reunir às 13hs para se deslocar as 14hs, no entanto, efetivamente, eles anteciparam o deslocamento”.

A secretaria teria informado a antecipação para todos os órgãos envolvidos e acompanhado a movimentação por meio de vídeo monitoramento das vias, drones e policiais militares, que enviavam as informações por meio do grupo no WhatsApp, segundo a ex-subsecretária. As primeiras mensagens relatavam que a descida dos bolsonaristas ocorria de forma “ordeira”.

[no entanto], “A partir das 14hs, começamos a receber informes no grupo ‘perímetros’ de manifestantes portando objetos que indicavam intenções de praticar atos violentos, tais como paus, estilingues mochila com pedras, etc”, disse Marília no depoimento.

 

A ex-subsecretária declarou ainda que todos os órgãos que estavam no grupo de WhatsApp foram alertados sobre a situação e que sabe que a Polícia Militar e a Polícia Civil “agiram em alguns casos para identificar e conter possíveis manifestantes com intenções criminosas”.

A partir das 14h30, segundo Marília, “as ações violentas tomaram um grande vulto com as ações de invasão e depredação dos prédios dos poderes públicos”. Ela disse ainda que a secretaria repassou todas os dados obtidos para a Polícia Civil e a Polícia Federal.

Anderson Torres

Questionada pela Polícia Federal sobre a participação de Anderson Torres, Marília Ferreira Alencar disse que o ex-ministro do governo Bolsonaro fazia parte do grupo do Whatsapp, assim como o ex-comandante da PM Fábio Augusto Vieira. Mas que não era comum que as mensagens fossem respondidas, o que também não ocorreu no dia 8 de janeiro.

Para ela, no momento da viagem de Torres – que saiu de férias e foi para os Estados Unidos –, “ainda não havia uma apreensão de que a manifestação pudesse ocorrer e que ela fosse violenta”.

Segundo Marília, Anderson Torres não solicitou informações sobre as manifestações, já que viajou para os Estados Unidos, no dia 6 de janeiro. A ex-subsecretária contou ainda que soube que o ex-ministro ligou para Fernando Oliveira, que estava à frente da pasta, durante os atentados, mas não soube falar sobre o teor da conversa.

A delegada da PF declarou que conheceu Anderson Torres por ele também ser delegado da corporação e atuante da Associação Nacional de Delegados de Polícia (ADPF), onde era diretora parlamentar. Antes de assumir a função na Secretaria de Segurança do DF, ela havia atuado como diretora de inteligência da secretaria de operações integradas do Ministério da Justiça, também a convite de Torres, quando ele comandava a pasta.

À Polícia Federal, ela disse que “não tinha uma relação de amizade com ele, mas foi indicada por pessoas em comum como um bom nome para assumir as funções no MJ [Ministério da Justiça]” e que os dois não tratavam de questões políticas.