Após apertar medidas, governadores têm recuado em ações de isolamento no último mês; só três Estados – SP, MG e AP – vetam a abertura de bares e restaurantes para clientes, segundo entidade
Das cerca de 22 mil mortes já registradas no Estado, 7350 foram registradas em março, ou 35% do total. Durante uma parte do mês, o governo suspendeu esse modelo de cogestão, que dá autonomia às prefeituras. Hoje, os números permanecem elevados: a ocupação é de 86% dos leitos de UTI no Sistema Único de Saúde (SUS) e, na rede privada, de 102%.
Na Bahia, esse movimento municipal causa preocupação. O secretário da Saúde, Fabio Villas-Boas, explica que o Estado conseguiu conter as taxas de transmissão da doença com medidas de restrição, incluindo o toque de recolher. O patamar de ocupação de UTIs, porém, segue elevado: 85%. “É temerário flexibilizar restrições de forma unilateral. Isso tende a gerar movimentação populacional na direção do município em abertura e aumento de contágio”, alerta.
Em Mato Grosso do Sul, todas as atividades estão liberadas – para conter a disseminação do coronavírus, a principal medida é apenas toque de recolher das 5h às 21h. Novamente, o governo estadual cita a responsabilidade municipal. “O governo de Mato Grosso já estipulou e divulgou as formas como os municípios devem agir em relação às medidas restritivas de enfrentamento à covid-19, como isolamento e distanciamento social. Portanto, diante deste contexto e das orientações do governo, cabe às gestões municipais a decisão de flexibilização do distanciamento e isolamento social, pois a execução de medidas restritivas é uma atribuição dos municípios”, diz nota enviada pela pasta da Saúde sul-mato-grossense.
O Rio planeja uma abertura mais ampla. Após duas semanas fechados, o governador em exercício do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PSC), autorizou reabrir bares, lanchonetes, restaurantes e shoppings, que voltaram a funcionar na sexta-feira, dia 9. Espaços culturais e estabelecimentos de lazer, como cinemas, teatros e bibliotecas, também podem funcionar. O horário de todos esses estabelecimentos, no entanto, é reduzido. A cidade continua com toque de recolher das 23h às 5h e as praias, cachoeiras e parques seguem fechados. Nas praias, estão permitidos apenas atividades individuais na água e na areia, porém a prefeitura já estuda autorizar em breve a prática de esportes coletivos em horário reduzido. Shows, eventos e festas continuam proibidos.
Desde o início da pandemia, em março do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro tem sido forte crítico das medidas de isolamento, sob o argumento do risco de desemprego alto. A redução dos contatos sociais é recomendada por especialistas e teve êxito em outros países, como Reino Unido e Portugal, onde as taxas de contágio caíram após o fechamento da economia. Bolsonaro chegou a entrar na Justiça contra os governos do Rio Grande do Sul, Distrito Federal e Bahia para derrubar decretos que previam toque de recolher – a ação foi negada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) sem análise de mérito.
Especialistas condenam flexibilização
O número elevado de casos e de mortes de covid nas últimas semanas indica que este não é o melhor momento de reabertura da economia, mesmo que gradual. A opinião é do epidemiologista Eliseu Alves Waldman. professor da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).
“Os dados mostram que não é o momento de abrir. O grande problema é que o País não tem coordenação única. Com isso, é difícil manter medidas restritivas por longo prazo em função das consequências econômicas. Elas não são pequenas”, afirma.
“Existem estudos que apontam que o lockdown é tão eficiente quanto à vacinação para conter a disseminação do vírus”, diz Flávio Fonseca, virologista da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “O principal responsável por esse cenário é a população brasileira que, de uma forma geral, não seguiu com rigor os três pilares da prevenção: evitar aglomeração, promover o distanciamento social e o uso de máscara. Podemos discutir os fatores que levaram a esse comportamento, como a falta de envolvimento do governo central, mas a população nunca aderiu de fato à prevenção”, opina.