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Em uma semana, motoristas embriagados matam quatro pessoas no DF

Por Carolina Cruz, G1 DF

Corpo de Bombeiros atual em socorro após colisão entre carro dirigido por motorista embriagado e moto na EPNB  — Foto: TV Globo/Reprodução

Corpo de Bombeiros atual em socorro após colisão entre carro dirigido por motorista embriagado e moto na EPNB — Foto: TV Globo/Reprodução

Entre segunda-feira (3) e sábado (8), quatro pessoas morreram em três acidentes causados por motoristas embriagados no Distrito Federal. Uma das colisões resultou na morte de dois garis, na última quinta-feira (6), em Sobradinho (relembre abaixo).

Nenhum dos condutores envolvidos teve ferimentos graves. Todos chegaram a ser detidos em flagrante, mas respondem pelos crimes em liberdade, após passarem por audiências de custódia.

A justificativa da Justiça é que os casos foram registrados como homicídios culposos – sem intenção de matar – e a legislação brasileira não permite prisão preventiva nessas situações, apenas em casos de crimes dolosos – quando há intenção ou se assume o risco de matar.

Entendimento da Justiça

O motorista envolvido no acidente que causou a morte dos dois garis é Josué Alexandro Reis, de 40 anos. Ao justificar a soltura dele, a juíza Lorena Alves Ocampos argumentou que “o caso é lamentável e a conduta causou consequências gravíssimas, tendo em vista o autor do fato ter atingido dois trabalhadores que vieram a óbito”.

No entanto, segundo a magistrada, “o crime em apuração está na modalidade culposa, de forma que, em sendo um agente primário e de bons antecedentes, a sua prisão preventiva não é admitida pelo ordenamento jurídico e a magistrada está vinculada à análise da lei, devendo segui-la”.

Ela também usou o mesmo argumento ao determinar a soltura de Antonisio Araújo da Silva, que matou um jovem de 24 anos em um acidente enquanto dirigia embriagado, também na última semana.

“O Código de Processo Penal permite a decretação da prisão quando a pena máxima do crime doloso é superior a quatro anos. Tratando-se de crime culposo, na análise do juízo de legalidade, a prisão não pode ser decretada”, disse na decisão.

Nos três casos, o Ministério Público do Distrito Federal também se manifestou pela soltura dos motoristas, o que foi citado pela juíza em uma das decisões.

“Não incumbe, portanto, a magistrada (…) a análise de cabimento de prisão preventiva se o próprio órgão de acusação manifestou não ser ela necessária, em consonância com o sistema acusatório, adotado pela Constituição Federal e pelo Código de Processo Penal, bem como de acordo com entendimento jurisprudencial recente”, disse.

Dolo eventual

Para o especialista em direito penal Leonardo Pantaleão, “a lei não diz claramente” que quem mata outra pessoa ao assumir a direção sob efeito de álcool está cometendo homicídio culposo. “Fica sob a interpretação de cada caso”, afirma.

De acordo com Pantaleão, existe também a possibilidade de o caso ser enquadrado como “dolo eventual”.

“O dolo eventual envolve a conduta do motorista. É quando ele não tem a intenção de matar alguém atropelado, por exemplo, mas está embriagado e dirige mesmo assim. Ele assume esse risco sendo indiferente a esse resultado. É como quem diz ‘tanto faz'”, explica.

No entanto, o especialista afirma que a análise sobre o enquadramento do caso deve ocorrer apenas durante o curso do processo, e não na fase inicial. Ele diz ainda que, mesmo estando o motorista embriagado, há outros fatores que podem descartar o dolo eventual e manter o crime como culposo.

“Imagine uma situação em que o motorista estava de fato embriagado, mas testemunhas e indícios deixam claro que ele tentou de toda forma evitar o acidente, como marcas de pneu, desvio. Neste caso, ele não estava indiferente em tentar evitar a morte de alguém”, afirma Pantaleão.

Audiências de custódia

Nos casos de morte em acidente envolvendo motoristas embriagados, o registro é feito por um delegado da Polícia Civil. Se o condutor for detido em flagrante, a manutenção da prisão deve ser analisada em audiência de custódia.

Segundo Leonardo Pantaleão, “a audiência de custódia tem como objetivo meramente avaliar se houve alguma ilegalidade na prisão, na conduta da polícia, se a pessoa detida teve os direitos resguardados. Não vai avaliar o mérito [ou seja, como a pessoa vai responde pelo crime]”.

Frente do TJDFT — Foto: Daumildo Júnior/G1

Frente do TJDFT — Foto: Daumildo Júnior/G1

Os condutores são julgados posteriormente, após apresentação da denúncia pelo Ministério Púbico e, neste momento, o crime inicialmente registrado como culposo pode ser alterado para dolo eventual. Se houver mudança, a pena também varia. Veja:

  • Homicídio doloso (considera intenção de matar): até 20 anos de prisão
  • Homicídio culposo (sem intenção de matar, ou com dolo eventual: 2 a 4 anos de prisão. Em casos de embriaguez ao volante, agrava-se a pena com mais 4 a 5 anos.

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), houve 116 casos de homicídio culposo na direção de veículo entre janeiro e julho deste ano. Os dados indicam redução de 24,2% em comparação com o mesmo período do ano passado, quando houve 152 ocorrências.

Vítimas

Motociclista Lucas Ribeiro dos Reis, de 24 anos, morreu após colisão com motorista embriagada, na EPNB — Foto: TV Globo/Reprodução

Motociclista Lucas Ribeiro dos Reis, de 24 anos, morreu após colisão com motorista embriagada, na EPNB — Foto: TV Globo/Reprodução

No domingo (9), Márcia Eli da Silva Faustino, de 55 anos, foi solta em audiência de custódia após matar o motociclista Lucas Ribeiro dos Reis, de 24 anos, na sexta-feira (7), durante colisão na EPNB. Ela estava com sinais de embriaguez.

Márcia não precisou pagar fiança. Ela deve usar tornozeleira eletrônica por 90 dias e está proibida de se ausentar do DF por mais de 30 dias sem autorização judicial. Além disso, deve cumprir recolhimento domiciliar das 20h às 6h de terça a sexta e em regime integral durante os sábados, domingos e feriados.

Atropelado enquanto trocava pneu

Felipe Alves da Silva, de 24 anos, morreu após acidente envolvendo motorista embriagado, em Planaltina — Foto: Reprodução/Redes sociais

Felipe Alves da Silva, de 24 anos, morreu após acidente envolvendo motorista embriagado, em Planaltina — Foto: Reprodução/Redes sociais

Na quarta-feira (5), a Justiça do DF determinou a soltura de Antonisio Araujo da Silva, de 43 anos. Ele foi preso em flagrante, na última segunda-feira (3), após atropelar e matar Felipe Alves da Silva, de 24 anos, em Planaltina – o jovem trocava um pneu do carro quando foi atingido.

Segundo a Polícia Militar, no momento do acidente, Antonisio Araujo estava bêbado. O teste do bafômetro apontou 0,66 miligramas de álcool por litro de ar expelido.

Com o impacto, carro de Felipe Alves, de 24 anos, foi arremessado contra poste de iluminação no DF — Foto: Corpo de Bombeiros do DF/Divulgação

Com o impacto, carro de Felipe Alves, de 24 anos, foi arremessado contra poste de iluminação no DF — Foto: Corpo de Bombeiros do DF/Divulgação

Garis mortos

Na última quinta-feira (6), o motorista Josué Alexandro Reis, 40 anos, atropelou e matou dois profissionais do Serviço de Limpeza Urbana (SLU) que pedalavam na BR-020. Ilda Barbosa de Sousa, de 52 anos, e Anísio de Oliveira Lopes, de 48 anos, morreram na hora.

Ilda Barbosa Sousa e Anísio de Souza Lopes foram atropelados por motorista bêbado no DF — Foto: Arquivo pessoal

Ilda Barbosa Sousa e Anísio de Souza Lopes foram atropelados por motorista bêbado no DF — Foto: Arquivo pessoal

O condutor tinha sinais de embriaguez. Quando a equipe de socorro chegou ao local, o carro dele estava tombado às margens da rodovia.

Marcas de pneus e pedaços das bicicletas foram encontrados ao longo de 20 metros da pista. Os detalhes foram analisados pela perícia e devem ser usados na investigação.

Bicicleta de profissional do SLU nas margens da BR-020 após atropelamento, no DF — Foto: TV Globo/Reprodução

Bicicleta de profissional do SLU nas margens da BR-020 após atropelamento, no DF — Foto: TV Globo/Reprodução

Adaptações; Alexandre Torres

Guará News